09/10/2019
1927: WAGNER-JAUREG

Artigo científico escrito por:
FERRARI, Aline G.
BAGGIO, Ana P.
Faculdade de Medicina UPF

 

RESUMO

O psiquiatra austríaco Julius Wagner-Jauregg foi o ganhador do Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 1927 pelo desenvolvimento da malarioterapia, inoculação terapêutica do agente causador da malária, no tratamento da dementia paralytica, doença decorrente de sífilis avançada, muito comum no início do século XX. A descoberta da malarioterapia teve grandes repercussões na época e constituiu o primeiro tratamento de choque para debelar uma doença, então incurável. Isto justifica o interesse e que a vida e a obra de Julius Wagner-Jauregg continua a despertar até hoje. Neste artigo, faz-se um relato da sua biografia, do desenvolvimento da pesquisa que lhe rendeu o prêmio Nobel e de algumas de suas outras contribuições para a ciência e à humanidade. A descoberta de Jauregg, mais do que à felicidade do acaso, deveu-se ao acúmulo das contribuições históricas da ciência que o autor conseguiu associar às observações derivadas de sua própria pesquisa . 
PALAVRAS-CHAVES: Julius Wagner-Jauregg, Prêmio Nobel, malarioterapia, dementia paralytica.

ABSTRACT

The Austrian psychiatrist Julius Wagner-Jauregg was the winner of the 1927 Nobel Prize of Medicine and Phisiology for the development of malaria therapy, therapeutic inoculation of the patological agent of malaria for treatment of dementia paralytica, a decurrent disease of advanced syphilis, very ordinary in the beginning of XX century. The discovery of malaria therapy had great repercussions that time and constituted the first shock treatment to control a disease, incurabel until then. It justifies the interest that the life and work of Julius Wagner-Jauregg continue to estimulate until today. In this article, we do a summary about his biography, the development of the research that lead him to win the Nobel Prize and other contributions for science and humanity. Jauregg’s discovery was due to the union of historical contributions of science that the author associated to observations of his own research. 
KEYWORDS: Julius Wagner-Jauregg, Nobel Prize, malaria therapy, dementia paralytica.

INTRODUÇÃO
 

O Prêmio Nobel foi criado em 1896 por Alfred Nobel, um milionário da indústria de explosivos, para laurear pessoas que se destacassem nas áreas de Física, Química, Literatura, Ciências Econômicas, Medicina e Fisiologia e na promoção da paz mundial. 
Julius Wagner-Jauregg foi o primeiro psiquiatra a ganhar o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia, em 1927, pelo desenvolvimento da malarioterapia como tratamento da dementia paralytica, estágio avançado de sífilis, que leva a psicose, degeneração progressiva e paralisia geral. A malarioterapia teve grandes repercussões no inicio do século XX, devido à inexistência de tratamento adequado e efetivo para as psicoses.  Atualmente, este tratamento não é mais utilizado em virtude de o diagnóstico precoce e o tratamento em fase também precoce da sífilis impedir a sua evolução. 
A vida e a obra de Wagner-Jauregg e a de outros ganhadores do Prêmio Nobel, tem despertado, nos acadêmicos, um interesse pela história da medicina e um reconhecimento da importância do desenvolvimento de pesquisas e tem sido também um importante estímulo, à realização de trabalhos científicos que possam contribuir para avanços na área médica.
O presente artigo tem a finalidade de apresentar a trajetória de vida de Julius Wagner-Jauregg, destacado pesquisador, e realçar algumas de suas contribuições para a ciência médica e para a humanidade. 

DESENVOLVIMENTO
 

Biografia
Julius Wagner nasceu no dia sete de março de 1857, em Wels, Oberösterreich, na Áustria.  Foi o segundo, de quatro filhos, de Ludovika e Adolf Johann Wagner. Após a morte de sua mãe, em 1867, suas irmãs foram para um monastério, enquanto ele, seu irmão e seu pai mudaram-se para Krems, em Nieder-Österreich. Em 1872, seu pai foi transferido para o Departamento de Finanças em Viena, onde formou-se com distinção no colégio Schottengymnasium e, em seguida, iniciou seus estudos em medicina na Universidade de Viena, em outubro de 1874.1   A medicina, no entanto, não era tradição na sua família. E, embora seu pai desejasse que fizesse filosofia, em virtude de o curso ser de menor duração e oferecer boas perspectivas de trabalho como professor, assim mesmo apoiou a escolha do filho.1
A Universidade de Viena era referência mundial em medicina e contava com  profissionais de renome. Durante a faculdade, prestou serviço militar e, enquanto estudante, trabalhou no Instituto Geral de Patologia Experimental sob a orientação de Salomon Stricker. Antes de sua avaliação final, publicou dois artigos.  O primeiro deles, publicado em março de 1878,  abordava a função dos nervos estimulantes cardíacos, , e o segundo sobre as atividades respiratórias do nervo vago, publicado em 1879. Em 14 de julho de 1880, dia da queda da Bastilha, obteve seu doutorado pela Universidade de Viena.1 
Em 1881, quando era assistente de Stricker no Instituto de Patologia, conheceu Sigmund Freud, com quem estabeleceu uma amizade que durou praticamente toda a vida1. Julius Wagner saiu do instituto em 1882.2,3
A especialidade preferida dele era a de medicina interna e por algum tempo teve esperanças em obter o cargo de assistente na clínica administrada por Heinrich von Bamberger, que o fez escrever um artigo sobre doenças e funções do rim. Porém, descordou dos resultados que Bamberger iria apresentar e acabou publicando anonimamente um artigo com os resultados que obteve. Assim, não conseguiu a posição na clínica. Em seguida, tentou uma vaga em outro local, sem sucesso.1
Após essas tentativas, alguns amigos o aconselharam a candidatar-se a  uma vaga de assistente na Clínica Psiquiátrica, dirgida por Max von Leidesdorf, em Viena. No dia seguinte, Julius foi conversar com Leidesdorf, apesar de nunca ter considerado a possibilidade de se tornar psiquiatra e não ter praticamente nenhuma experiência na área.3 Então, em outubro de 1882 comprou um livro de psiquiatria e em dezembro começou a trabalhar na clínica, sendo oficializado no cargo em janeiro do ano seguinte.1
Em 1883, seu pai, um pouco antes de aposentar-se, ganhou o título de Ritter, por ter servido o Império Germânico, e adicionou o nome Ritter von Jauregg, sendo este último uma adaptação do sobrenome de solteira de sua mãe. No entanto, após o final da Primeira Guerra Mundial, os austríacos perderam seus títulos, mas, Julius Wagner Ritter von Jauregg ganhou permissão para usar o nome Wagner-Jauregg.1
Em 1885, incentivado por Liedesdorf, Jauregg tornou-se Privatdozent em neurologia e, dois anos mais tarde, também se tornou Privatdozent em psiquiatria para tentar um cargo acadêmico. Neste mesmo ano, Liedesdorf sofreu um grave infarto e pelos dois anos seguintes, Jauregg assumiu suas aulas e a direção da clínica.1
Em 1889, foi nomeado Professor Extraordinário da Faculdade de Medicina da Universidade de Graz como sucessor de Krafft-Ebing e Diretor da Clínica Neuro-Psiquiátrica de Graz.1, 3 Em 1893, Jauregg também se tornou Professor Extraordinário de Psiquiatria e Doenças Nervosas da Universidade de Viena e Diretor da Clínica de Psiquiatria e Doenças Nervosas de Viena.3
Publicou inúmeros trabalhos, entre eles: Myxödem und Kretinismus (1912); Lehrbuch der Organotherapie (1914); Verhütung und Behandlung der Progressivem Paralyse durch Impfmalaria (1931) – “Prevenção e tratamento da paralisia progressiva por inoculação de malária”, sendo esta a sua principal publicação.3  Também, dedicou-se à medicina forense e aos aspectos legais da insanidade. Ajudou a formular as leis de proteção à doentes mentais.1,3 Em reconhecimento ao seu trabalho na medicina forense, recebeu o diploma de Doutor em Direito.3 Além disso, Jauregg tornou-se membro honorário em inúmeras instituições científicas de diversos países.3 
Foi processado por maus tratos a soldados durante a Primeira Guerra Mundial. Durante este processo, Freud depôs contra Jauregg, o que ocasionou o rompimento definitivo  dos laços de amizade entre ambos.  No final do processo, Jauregg foi absolvido.1
Casou-se com Ana Koch, com quem teve dois filhos: Julia, nascida em 1900, e Theodor, nascido em 1903.3 Após aposentar-se, em 1928, Jauregg ainda publicou mais 80 trabalhos, gozou de boa saúde e permaneceu ativo até sua morte em 27 de setembro de 1940.3 Alguns anos após a sua morte, soube-se que Jauregg era nazista e tinha apoiado o programa de raça pura de Hitler. Este fato chocou a Áustria, país que o havia homenageado dando seu nome a escolas, ruas e hospitais.1
O interesse pela tireóide 
Ainda na clínica em Viena, Jauregg começou a relacionar bócio e cretinismo. A partir daí, motivou-se a realizar experimentos com animais. Em 1884, ao retirar a glândula tireóide de alguns gatos, observou que, após alguns dias, eles morriam.1
Como a cidade de Graz, capital da província de Styria, era conhecida por ter altos índices de bócio e cretinismo, Jauregg começou a investigar, por volta de 1892, o papel da tireóide nestas doenças através de uma pesquisa em três áreas endêmicas da província, instituindo um tratamento com iodo e observando seus efeitos.1
Em 1898, convenceu-se de que a ingesta regular de pequenas quantidades de iodo era profilática contra bócio e cretinismo e propôs que iodo deveria ser adicionado ao sal vendido em áreas onde o bócio era endêmico. Essa medida foi colocada em prática pelo governo austríaco em 1923, alguns anos depois de a Suíça ter tomado medidas semelhantes.1,5
O início de estudos do uso da febre como terapia
Foi enquanto membro da equipe de psiquiatria da Universidade de Viena (1883-1889), trabalhando na Clínica Psiquiátrica, que Jauregg notou que pessoas que sofriam de certos distúrbios nervosos apresentavam uma melhora significativa no estado mental após contrair doenças febris, como tifo e erisipela.1  O primeiro contato com este fato foi com uma paciente da clínica que, em 1883, logo após ter contraído erisipela recuperou-se de uma grave doença mental.4
Em 1887, Jauregg publicou um artigo sobre “O efeito de doenças febris em psicoses”, uma revisão de literatura e relato de casos de sua própria experiência. Neste trabalho, observou que erisipela era a doença mais efetiva no tratamento de psicoses, seguida por febres intermitentes.4
A partir daí, começou a especular se seria justificável gerar febre como terapia para psicoses. Ele achava que, embora as evidências fossem insuficientes, havia motivos para continuar suas pesquisas. Assim, seria necessário coletar dados estatísticos de efeitos de infecções de ocorrência natural em pacientes com distúrbios mentais. As doenças que prejudicavam o paciente e não podiam ser controladas e aquelas que não podiam ser provocadas artificialmente deveriam ser excluídas do uso terapêutico. Desta maneira, sobraram febres intermitentes e erisipela. A primeira poderia ser tratada com quinino e a segunda era considerada uma doença benigna.4
Ao retomar seus estudos, Wagner-Jauregg concluiu que psicoses poderiam ser curadas com febre. Conseqüentemente, era necessário estudar as condições em que isto acontecia. Então, ele continuou suas pesquisas experimentais e teóricas. No inverno de 1888/89, inoculou uma cultura de estreptococos causadores de erisipelas em diversos pacientes, mas obteve resultados negativos, o que o deixou muito decepcionado fazendo-o abandonar os experimentos e somente resumiu-os em 1890.4
Tentativas com o uso da tuberculina
Um de seus colegas, Theodor Escherich, conhecido pediatra, deu a Wagner-Jauregg uma garrafa de tuberculina, descoberta naquele ano (1890) por Robert Koch. Essa substância possibilitava a continuação de seus experimentos de modo seguro, já que, através dela, podia-se produzir artificialmente os efeitos de infecção bacteriana, sobretudo febre, sem os perigos de uma verdadeira infecção bacteriana. Durante o inverno de 1890/91 ele tratou alguns pacientes e obteve resultados favoráveis. Entretanto, abandonou os experimentos por algum tempo, pois o processo de cura com tuberculina era muito lento  e também só eram admitidos, na Clínica Psiquiátrica de Graz, os casos agudos e os pacientes permaneciam por pouco tempo. Além disso, em suas “Memórias” confessou que apesar dos bons resultados, ele não continuou os experimentos por causa de reportagens alarmantes que subestimavam o uso terapêutico de tuberculina e, em decorrência de seu uso, aconteceram algumas mortes.4   Mais tarde, retomou os experimentos com tuberculina, mas associada a outros tratamentos. Obteve resultados positivos, porém não conseguiu a eficácia desejada.4 
Bases para o desenvolvimento da malarioterapia 
Jauregg não foi o primeiro a correlacionar febre com doenças mentais. Hipócrates observou que as convulsões induzidas por malária em pacientes insanos eram capazes de curá-los. Posteriormente, na Idade Média, alguns médicos notaram os mesmos fenômenos após um grave surto de febre, tal como ocorreu durante epidemias de cólera em asilos para doentes mentais. Em 1786, um médico chamado Roess observou que pacientes mentais melhoravam após a inoculação com vacina contra a varíola.6 
Aparentemente, o primeiro médico a induzir uma doença infecciosa em pacientes mentais foi o psiquiatra Alexander S. Rosemblum, em um hospital psiquiátrico em Odessa, Rússia. Naquela época, quase nada se sabia a respeito de Rosemblum no Ocidente. Este psiquiatra publicou, em 1876/77, um artigo original intitulado “Relação de doenças febris e psicoses”, onde analisou dados de literatura e contabilizou os benefícios e os efeitos curativos da malária, febre tifóide e de febres recorrentes em psicoses da sua própria observação. Ele estudou 22 casos de pacientes psiquiátricos, dos quais 11 foram completamente curados após um episódio de febre recorrente, 3 foram parcialmente curados e 8 permaneceram com o quadro inalterado.4 
Sua descoberta sobre o tratamento com febre também se baseou em descobertas revolucionárias da microbiologia, através da qual descobriu-se, em 1885, que a malária era transmitida por um mosquito (Anopheles). Em 1905, foi descoberto o agente patológico da sífilis (Treponema pallidum) e também que febres altas eram capazes de matar os espiroquetas que causavam sífilis. No ano seguinte, Wasserman descobriu um teste sorológico para a sífilis (usado até hoje) que permitia a detecção precoce da doença. E, em 1913, foi provado, por Wasserman e Noguchi, que a dementia paralytica era mesmo causada por uma infecção do sistema nervoso central, desencadeada pela sífilis.6
Malarioterapia
Apesar de já ter sugerido a produção artificial de malária para tratar psicoses em 1887, Jauregg só retomou a idéia em junho de 1917 (em Viena), quando seu colega, Alfred Fuchs, o procurou para saber se dava ou não quinino a um soldado ferido que tinha chegado ao hospital com um pequeno dano nos nervos e crises de febre acompanhadas de tremores. Imediatamente lhe ocorreu a idéia de inocular pacientes com dementia paralytica com o sangue do paciente malárico. Portanto, respondeu que não e explicou a Fuchs o que pretendia fazer.4 
Em 14 de junho de 1917, ele tirou sangue da veia do soldado durante uma crise de febre e inoculou em dois pacientes paralíticos. Então, ocorreu-lhe que poderia haver mosquitos Anopheles na área da clínica e a malária poderia se espalhar. Assim, pediu a um de seus pacientes neuróticos, que ainda podia fazer tarefas simples, para que coletasse tantos borrachudos quantos ele conseguisse para que fossem examinados. Aliviado por não ter encontrado nenhum Anopheles dentre eles, o pesquisador tirou mais duas amostras de sangue do soldado e injetou no subcutâneo do dorso de três pacientes paralíticos e com o sangue de um paciente deste grupo, inoculou mais dois pacientes. Em todos estes casos foi microscopicamente confirmada a presença de plasmodium no sangue.4  Dos nove pacientes, um morreu enquanto Jauregg esteve ausente (em uma comissão médico-científica) e dois foram enviados para o asilo psiquiátrico meses depois do tratamento. Os seis restantes apresentaram melhoras consideráveis, embora dois destes tenham tido reincidência.4
Após estes experimentos, Jauregg realizou um estudo comparativo entre pacientes que foram submetidos apenas a malarioterapia e pacientes que, além da malarioterapia, receberam tratamento subseqüente com neosalvarsan. Os pacientes do segundo grupo apresentaram 48,5% de remissão total da doença contra 25% no primeiro grupo. Assim, Jauregg concluiu que o tratamento associado era mais efetivo.3  Neste tratamento associado, ele administrou, depois de oito episódios de febre, 1g de quinino bisulfato por dia durante três dias e 0.5g diariamente por mais quatorze dias. Em todos os casos a febre baixava já nas primeiras doses. Além disso, os pacientes recebiam injeções intravenosas de Neosalvarsan em intervalos semanais.4 
Não se pode esquecer que a proteção dos pacientes contra o mosquito Anopheles tornou-se necessária devido ao risco de gerar uma epidemia de malária. Por isso, os pacientes eram mantidos sob mosquiteiros durante todo o tratamento.3
Como Jauregg queria continuar suas pesquisas com malarioterapia e não tinha mais pacientes com malária na clínica, aproximou-se de um especialista em medicina interna que trabalhava em um hospital militar onde havia vários pacientes com a doença, para conseguir sangue de um caso confirmado de malária. Infelizmente, Jauregg não examinou microscopicamente a amostra recebida porque temia que qualquer demora poderia afetar a natureza infecciosa do sangue; e imediatamente injetou em um paciente paralítico. Quando a temperatura deste subiu, ele retirou um pouco sangue para injetar em outros três pacientes. O primeiro ficou seriamente doente; a febre não cessava apesar das grandes quantidades de quinino usadas. A análise do sangue mostrou que praticamente todas as suas células sangüíneas estavam cobertas de plasmodium. O número de glóbulos vermelhos decresceu assustadoramente e seus leucócitos desapareceram. Estava claro que era um tipo maligno de malária – malaria tropica. O paciente morreu após 31 dias, assim como outros dois. O único sobrevivente recebeu altas doses de quinino e Neosalvarsan durante 45 dias; sua paralisia foi curada completamente. Entretanto, este fato desencorajou Wagner-Jauregg a continuar seus experimentos por algum tempo.4
Em setembro de 1919, um ano antes de Jauregg retomar suas pesquisas, o bacteriologista R. Doerr procurou-o pois havia encontrado um caso de malária terçã confirmada. Doerr não estava preocupado com os pacientes paralíticos, no entanto precisava realizar experiências com vacina contra malária. A seu pedido três pacientes foram injetados com diferentes concentrações de sangue do paciente malárico. Mas os resultados não foram de acordo com suas expectativas.4 Dos pacientes paralíticos que receberam sangue contaminado com malária, foram retiradas amostras para inoculação da doença em outros pacientes. A partir daí, a malarioterapia para dementia paralytica foi usada em larga escala na Clínica Psiquiátrica de Viena.4
É importante ressaltar que a melhora da saúde mental e física dos pacientes não necessariamente acontecia imediatamente após o tratamento. Pelo contrário, levava até seis a doze meses para que o paciente voltasse as suas ocupações normais.3
Além disso, o resultado do tratamento dependia muito do estágio da doença. Quanto antes, melhor. Isto foi comprovado em um estudo onde Jauregg tratou pacientes em estágio inicial e com bom prognóstico. Dentre estes casos, 84.8% tiveram uma remissão completa e 12.1%, remissão parcial da doença.3
Tais resultados levaram a formulação de uma outra hipótese sobre a validade deaplicar-se o tratamento em pacientes sifilíticos em risco de ter dementia paralytica, ou seja, naqueles que tinham reação positiva do líquido cefalorraquidiano para espiroquetas. Sim. De acordo com outro estudo, um tratamento com malária, precedido e sucedido por tratamento com neosalvarsan, trazia bons resultados na medida em que eliminava os espiroquetas do líquido cefalorraquidiano dos pacientes.3
O desenvolvimento da malarioterapia teve repercussões mundiais, pois trouxe grandes avanços para a medicina, revolucionando os tratamentos psiquiátricos. Por esse tratamento inovador, Jauregg ganhou o prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 1927.  A descoberta abriu caminho para o desenvolvimento de outros tratamentos de psicoses através de choques, como: choque insulínico, convulsões químicas e choque eletro-convulsivo.6 
Apesar de sua grande importância, no contexto da época, o tratamento desenvolvido por Wagner-Jauregg está atualmente ultrapassado devido à raríssima incidência de dementia paralytica e a introdução de tratamento farmacológico com antibióticos.

CONCLUSÃO

O Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia de 1927, concedido ao psiquiatra austríaco Julius Wagner-Jauregg, salientou a importância do desenvolvimento da malarioterapia para o tratamento da dementia paralytica, doença decorrente de sífilis avançada. 
A malarioterapia revolucionou a compreensão e o tratamento de doenças mentais nas primeiras décadas do século XX,. Até então, pessoas com este tipo de doença simplesmente ficavam em asilos psiquiátricos, onde recebiam apenas alguns cuidados simples e, algumas vezes, apoio social, sem acesso a nenhuma terapia efetiva. 5
Ficou evidenciado que o trabalho de Jauregg não foi uma descoberta casual, mas sim, uma interação de inúmeras idéias e trabalhos realizados por diversos outros pesquisadores em diferentes épocas da história, que, somados aos acontecimentos da época vividos por Jauregg e à suas pesquisas – observacionais e experimentais, culminaram na descoberta de um tratamento inovador para doenças mentais que não está sendo utilizado atualmente.
Dentre outras contribuições de Wagner-Jauregg para a ciência e para a humanidade, destacam-se o trabalho sobre a glândula tireóide, que levou a adição de iodo ao sal de cozinha como medida preventiva de bócio e cretinismo e as leis de proteção a doentes mentais.
As informações sobre a vida e a obra deste importante pesquisador e o incentivo proporcionado pelo Prêmio Nobel, serviram de estímulo para a busca do conhecimento e aumentaram o interesse pelo desenvolvimento de pesquisas que contribuiram para avanços significativos no mundo científico. 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
1- Who named it? Julius Wagner-Jauregg. Disponível em: www.whonamedit.com/doctor.cfm/2753.html Acesso em: 17 set. 2005.
2- Só Biografias. Julius Wagner-Jauregg Disponível em: http://www.sobiografias.hpg.ig.com.br/JuliWJau.html Acesso em: 15 set. 2005.
3– Nobel Prize. Julius Wagner-Jauregg Disponível em: http://nobelprize.org/medicine/laureates/1927/index.html Acesso em: 15 set. 2005.
4- WHITROW, Magda. Wagner-Jauregg and the fever therapy. Medical History, 1990, 34: 294-310
5- Especiales Diário Médico. Julius Wagner-Jauregg. Disponível em: http:/medcine.4t.com/nobel1927.html Acesso em: 17 set. 2005.
6- SABBATINI, Renato M. E. A história da terapia por choque em psiquiatria. Disponível em:
http://www.cerebromente.org.br/n04/historia/shock.htm Acesso em:  15 set. 2005.
Orientadores:
Evânia Araújo
Jorge Salton
 

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